Na semana passada – mais precisamente, no dia 2 de junho, quinta-feira – o IBGE divulgou que o PIB brasileiro, ao totalizar R$ 2,2 trilhões nos valores correntes, crescera 1% no primeiro trimestre, comparativamente ao anterior. Em complementação, apresentaram-se algumas comparações correlatas, conforme as quais o mesmo índice aumentara mais ainda, 1,7%, em face do mesmo período em 2021, além de acumular 4,7% nos derradeiros 12 meses. Tais números bastaram para que a Nota Informativa da Secretaria de Política Econômica, órgão subordinado ao Ministério da Economia – conhecido pela sigla SPE/ME – se autonomeasse, pomposamente, a Consolidação da Retomada Econômica.

O mesmo texto festejou a sua própria antecipação de 1,5% para o PIB em 2022. Assim, resolveu registrar um viés de alta, visto como prova de uma segura e constante atividade na economia, vez que seguiria os 4,6% positivos do ano passado. Ato contínuo, surgiram combinações ligeiras dessas projeções com dados “virtuosos”, a exemplo da retração no desemprego, queda na inflação, aumento na taxa de investimento e multiplicação na soma dos estabelecimentos capitalistas. Subitamente, o diagnóstico ganhou a mídia e provocou certo frisson nas instituições privadas especializadas em vislumbrar os cenários futuros do mercado burguês, que rapidamente se aninharam no discurso palaciano.

A repercussão do enfoque governista entre os conglomerados hegemônicos na comunicação de massas reflete o desejo artificial de camuflar o ciclo econômico adverso, já que a opinião pública vem anunciando a propensão de votar nas oposições para se livrar da inflação, da estagnação e da pauperização. A própria chefia falangista e os seus aliados, com a costumeira simplificação, já disseram e repetiram que podem perder a eleição por causa dos preços em alta nos combustíveis. Logo, ficam patentes a origem e o teor dos alaridos que soaram na semana passada. Foram dois, que surgem, habitam e proliferam no lusco-fusco situado em algum ponto entre a mentira, o empirismo e a ilusão.

A primeira falácia reside na falsa notícia de que o PIB recém-disseminado seria uma originalidade. A elevação agora confirmada é, porém, tão somente a tendência notada pela FGV no mês passado, incorporada pelo FMI e festejada em Davos. Aliás, 0,5% menor do que a prometida por Guedes. Logo, a mentira reside na postulação do velho – sucedido e até já dito – como se fosse o novo. A outra falácia, todavia, é menos direta e mais astuciosa, pois amparada em parcialidades para esconder a totalidade como lugar da verdade. Para desmascarar tal mentira, que tem ao menos a desculpa de se fantasiar como ilusão, basta perceber as múltiplas e diversas determinações sintetizadoras do real.

De fato, a baixa no desemprego foi de 3,8% se, perante os 11,1% no primeiro trimestre, forem lembrados aqueles 14,9% no mesmo período há 12 meses. No entanto, se os noventa dias anteriores forem tidos como referência, o desemprego se mostrou estagnado, isto é, a recuperação das contratações parou. Ademais, as estatísticas denunciam que os postos criados eram majoritariamente precários e sem direitos, além de conterem salários inferiores, o que denuncia uma pauperização em marcha. O IPCA-15 subiu 0,59%, em maio – menos do que fizera em abril –, porém, foi o maior para os idênticos meses dos sete últimos anos, reiterando a depreciação monetária e a carestia galopante.

Será que o metabolismo dominante pelo menos estaria em recuperação? Basta olhar mais fundo: no trimestre janeiro-março, a formação bruta em capital fixo recuou 7,2% após cinco meses de crescimento e a taxa de investimento caiu 1% se cotejado ao mesmo período no ano anterior. Mas, e o milhão de novas empresas surgidas no primeiro trimestre, superior em 19% ao verificado há dois anos, com cerca de 80 mil novos CNPJ só em março? Representaria uma expansão física da burguesia, prenúncio da retomada? Ora, 79% são da espécie MEI, formada por “contapropristas” ou trabalhadores por conta própria. Os demais são, majoritariamente, pequenos empresários que vieram de quebras.

O crescimento em 2021 e os baixos índices atuais só vêm recuperando a devastação. Persiste o baque cíclico iniciado em 2014, adubado pela pandemia e pelas políticas ultraliberais. Tal situação é agravada pela conjuntura planetária, em que as recaídas estagflacionárias se multiplicam e intensificam pela guerra na Ucrânia. Os prognósticos mais otimistas estimam o paraíso em breve, mas, exceto a bazófia oficial, os indicadores sugerem o PIB menor durante o segundo semestre e pior em 2023. Cabe ao campo democrático e progressista, nucleado pelos partidos à esquerda, o desafio de vencer no voto para remover a herança deixada pelos magnatas e aliviar o peso que jogaram no colo do povo.

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