Os dois resultados no STF, noticiados na terça-feira, 21/5/2024, constituem o encerramento cabal da condição vegetativa em que a Laja Jato agonizava. Diga-se de passagem, o coma da malfadada operação ativista, fantasiada institucionalmente como procedimento judicial, guardava uma especificidade. O seu corpo, em vez de prolongar-se, naturalmente, na condição abismal de inconsciência e torpor, sem respostas intencionais a estímulos externos, estrebuchava na sociedade política para disputar os seus espaços minguantes, inclusive nos parlamentos, e tentar safar-se das consequências penais, ao ponto mesmo de se converter na única tarefa relevante que restou para Moro e Dallagnol.
Importa menos que a sentença favorável ao ex-ministro e deputado José Dirceu tenha sido motivada pelos prazos de prescrição, vencidos à época da sentença condenatória, ou que a decisão anulatória dos atos perpetrados contra o empresário Marcelo Odebrecht ampare-se no menosprezo ao devido processo legal. O que de fato realça o fracasso do projeto vicejante outrora na espúria “República de Curitiba” é o arbítrio interessado que ignora normas e direitos, como as regras institucionais que sustentam o contraditório e a resultante ampla defesa, tudo, agora reconhecidamente, por meio do “conluio […] para garantir seus objetivos – pessoais e políticos”. Os fins do ativismo togado, claro.
Releve-se, não como questão menor, mas como ponto prático mais vultoso no contencioso da conjuntura, o equívoco embutido na ministerial evocação ao “Estado democrático de Direito”. Semelhante recurso ao conceito inscrito na Constituição, além de se distanciar do real conteúdo hegemônico em todo aparato superior de poder, omite o regime político fixado legalmente. O tema verdadeiro e concreto é a relação democrática, importante para os cidadãos, políticos e classes ou frações, que – sob a dominância e o metabolismo intrínsecos ao capital – pelo menos mitiga, embora preservando, a inevitável assimetria social. Eis porque os julgamentos foram significativos para os rumos nacionais.
Ademais, os sinos badalam no enterro do famoso defunto, mas ainda vagam fantasmas pelas salas e funções públicas, como sinalizam os votos punitivistas em casos ligados ao vulgarmente chamado “mensalão” e a leniência consensual para blindar o mandato senatorial do “conje”, que assombram os desavisados. Assim, as “imperfeições”, tidas não raro como falhas “éticas”, deveriam ser vistas com menor surpresa, pois as condições objetivas fundamentais que as geraram continuam existentes. Quem pode sustentar – com base na hipotética balança idealista – que o placar de 7×0 que salvou certo mandato seria mais repulsivo do que meritório foi o 3×2 que livrou alguém da masmorra?
Obviamente, a semana passada reservou à história episódios a mais de vacilação e acordos, para o bem ou para o mal. Todavia, mais produtivo que se lamentar na expectativa ilusória de coerência moral é prosseguir na luta política para derrotar os reacionários e preservar os entendimentos amplos, visando a conquistar outras vitórias, inclusive nas eleições municipais. O momento é não de buscar pessoas “perfeitas”, se tais existiram um dia, mas de fazer alianças com seres humanos reais, afinados pelo propósito comum de manter os direitos laborais, construir melhores condições de vida popular, proteger as liberdades fundamentais e alcançar o progresso econômico-social com soberania.