Na data internacional das mulheres, a mídia monopolista-financeira colocou na pauta o combate feminino pelos direitos e igualdade, derramando assim o perfume da unanimidade. Note-se que, por baixo do coro nominal das homenagens, camuflavam-se as diferenças reais de classe. Frequentemente, o salário igual para trabalho igual era referido só a “gêneros” diferentes, ocultando a discriminação do mundo laboral sob as outras motivações, como “raça”, nacionalidade, cultura, identidade sexual e “mérito”. A perspectiva destacou as pessoas – individualmente –, no máximo a particularidade celebrada, pondo em segundo plano e até ignorando a condição proletária e a exploração capitalista.
O calendário, porém, fixa pontos sem preocupações com a conjuntura. Eis porque a última semana de fevereiro e os primeiros dias em março evidenciaram outro assunto: a iniciativa política da extrema-direita, com a sua oposição constante, sem princípios e sem limites. Em 25 de fevereiro, mobilizaram dezenas de milhares para negar os próprios delitos e pedir “anistia” para os seus criminosos. Depois, valendo-se dos critérios vigentes na Câmara Federal, o PL – ostentando a hegemonia e o comando bolsonarista, que operaram como tacapes – indicou, para presidir quatro comissões importantes, os parlamentares mais desqualificados, virulentos e fascistas, em confesso desdém pelo futuro do País.
Todavia, o mais relevante não é o que os reacionários fazem ao contrário do que alardeiam, para provocar uma instabilidade política nacional e deter as medidas progressistas. Os seus agrupamentos e falanges desempenham, tão somente, um papel tradicional e previsto, conforme o mando e o soldo que lhes transmitem a fração mais conservadora dos magnatas. Mais preocupantes são as sinalizações remetidas pela sociedade civil e pela sociedade política, sobre dois sérios problemas que afetam o Governo Federal e os partidos que o apoiam. Um diz respeito à imagem pública. Outro se refere à inércia em face de aliados, que vem desfavorecendo a governabilidade geral e a unidade nas eleições.
As recentes pesquisas de opinião constatam que descem as taxas de “aprovação” e “avaliação positiva” relativamente ao governo Lula, enquanto sobem as que sugerem “desaprovação” e “avaliação negativa”, indicando a permanência da polarização e a divisão ao meio da população, anuviada quando aparece a opção “regular”. Tais movimentos, cujas tendências já se mostravam no semestre passado, indicam um complexo de fatores. No entanto, sobressai a carência de um plano claro e visível de objetivos em curto e médio prazos, vez que as realizações, fragmentadas, carecem de capacidade para dialogar com as classes “de baixo”, na condição de conjunto, e mais ainda com a nação brasileira.
Semelhantes avaliação e vazio, parcamente preenchidos por discursos do primeiro mandatário em ocasiões oficiais, acabam intensificando a face inorgânica dos entendimentos, já que, além de jamais serem verbalizados com a necessária valentia e sustentados por dirigentes ou autoridades, só aparecem quando esfarelados em ações de última hora, efêmeras e localizadas, como remendos a tampar buraco. Na consciência das massas em disputa, é a hiperdireita que bafeja determinação. Nem os 60 anos do golpe vêm merecendo a participação de partidos e setores democráticos, por cima de suas diferenças, que há tempos deveriam estar reunidos para organizar um evento comum e unitário.
Não se pode perder mais um ano. As indefinições na situação atual precisam de urgente reversão, mediante um plano que tenha como centro a melhoria sensível nas condições básicas das multidões, assim como a coesão das forças democráticas e populares no esforço de ação compartilhada. Só assim poderão ser criadas novas circunstâncias e atitudes, mais favoráveis, para neutralizar o ânimo da ultradireita e recuperar o curso perdido em 15 meses de navegação em ziguezague. Mais do que jogarem o seu papel de núcleo dinâmico na imprescindível frente ampla, cabe às forças populares, até hoje dispersas e atirando cada qual para o seu lado, apontarem os rumos e darem o exemplo.