Por Hora do Povo—
A Hora do Povo entrevistou José Reginaldo, eletricitário do Sul de Minas Gerais, que substituiu provisoriamente, na presidência da Nova Central, o lendário José Calixto, quando do seu falecimento. Reginaldo é doutor em Serviço Social, com especial dedicação à formação sindical e, também, diretor executivo da CNTI (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria). Nossa conversa foi sobre a iminente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido da liberação de cobrança para os não sindicalizados (mas beneficiados pelos acordos coletivos) da Contribuição Assistencial, decidida em assembleia da categoria, por ocasião da negociação coletiva, com teto de 1% do salário.
HP – O que significa para o movimento sindical essa decisão do STF?
JR – O STF reconheceu o direito de arrecadação do movimento sindical, através da contribuição de toda categoria, inclusive os não sindicalizados que se beneficiam dos acordos e convenções coletivas, Desta forma, restabelece a democracia plena no país. É um reconhecimento de que o STF errou em decisões passadas. Está corrigindo um desvio de finalidade. É o Supremo sendo um parceiro efetivo da sociedade, como foi na pandemia e na luta contra o fascismo golpista de Bolsonaro. Agora, no combate às injustiças e desigualdades. A proteção social do trabalho está sendo reconfigurada.
HP – Quer dizer: sem Contribuição Assistencial não tem democracia?
JR – Não se pode falar em democracia sem uma presença forte do movimento sindical. Essa regra estava quebrada. A própria Justiça do Trabalho não existe sem o movimento sindical. O movimento sindical brasileiro, durante a pandemia, foi uma das poucas instituições que mantiveram atividade plena. Em 2022 conquistou 510.000 cláusulas positivas para os trabalhadores, mesmo tendo havido uma redução de 99% da sua receita. Temos que lembrar que os partidos políticos recebem financiamento público, pago com impostos compulsórios, sem nenhuma discussão com a sociedade, e o que, efetivamente, têm feito, em sua maioria, dentro do Congresso Nacional, para a proteção social do trabalho?
HP – O que levou o STF a mudar de posição?
JR – Como o Judiciário teve um papel importante na defesa da democracia, da saúde na pandemia, fez a ponte, e creio que percebeu o significado do movimento sindical para os trabalhadores e para a democracia. É urgente que este reconhecimento seja efetivado. Estamos diante de uma campanha virulenta em que o objetivo é demonizar o movimento sindical perante a sociedade. Parte das elites é movida por um preconceito hereditário, arraigado por 300 anos de escravidão, apoiado pelos donos do capital, que veem com bons olhos a supressão de direitos, até o limite do trabalho análogo à escravidão.
HP – Mas não tinha acabado também para os empresários?
JR – O Judiciário, o Legislativo e o Executivo sabem – porque são muito mais íntimos – que há um desequilíbrio total. Os patrões têm um sistema de custeio, o Sistema S, compulsório, muitas vezes superior à Contribuição Assistencial.
HP – O modelo de sindicalismo europeu e americano de pluralismo sindical não é mais moderno?
JR – É fundamental perceber a importância para o trabalhador da unicidade sindical. As negociações sindicais no Brasil, um país continental, têm uma das maiores coberturas do mundo. Equiparam-se aos países escandinavos e estão na frente de países como Alemanha, Suíça, Canadá e Inglaterra. A crítica que se faz ao movimento sindical não é pelo conhecimento, é pela ignorância. Não é à toa a pressão para os poderes constituídos zerarem a arrecadação sindical e a simpatia que transpiram pelo pluralismo sindical.
HP – Qual dos dois modelos é mais significativo para a ação sindical e tem reflexo na base?
JR – A unicidade, sem dúvida. A cobertura negocial é a mostra disso, acabamos de dizer. Recorro, como sempre fala um amigo nosso, o dr. Gerson, para mostrar a higidez do modelo sindical brasileiro, se o movimento sindical fosse uma empresa, perdendo nos últimos 6 anos 99% de sua receita, já teria pedido falência. Não pediu porque o movimento sindical ainda tem a verve da sobrevivência, de como nasceu. O movimento sindical é símbolo da resistência e da luta pela justiça social e é na unidade, jamais no divisionismo, que ele se sustenta.
HP – A decisão do STF muda alguma coisa na Comissão Tripartite – trabalhadores, empresários e governo – constituída pelo presidente Lula para discutir a reforma sindical?
JR – O combinado na campanha eleitoral é elaborar uma proposta do que tem que ser revisto da reforma trabalhista do Temer e do Bolsonaro. O principal da reforma sindical, o que une o movimento sindical, o que é o maior problema, é a autonomia das assembleias e o sistema de custeio das entidades sindicais. Nesse terreno, com o andar da votação no STF, já tivemos um grande avanço. O importante agora é a mobilização para a plenária virtual no dia 12 de setembro, do movimento Revoga já. Esperamos 900 entidades sindicais.
HP – A Plenária vai discutir o que?
JR – Nosso raciocínio é simples. O que foi mudado da CLT pelo Temer e o Bolsonaro foi para piorar. Então, vamos mobilizar o mundo sindical para um projeto de lei capaz de unir todos. Vamos ao Congresso Nacional, com força, pela não terceirização das atividades-fim, não ao trabalho intermitente, não à jornada de 12 horas. Regulamentação com dignidade ao trabalho em plataforma, entre outras. Para priorizar os sindicatos nas negociações coletivas, defendemos que as homologações sejam feitas no sindicato, a volta da ultratividade (enquanto não se chega a um acordo, prevalece o anterior) e o fortalecimento da Justiça do Trabalho.
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