Com a eleição de Lula-Alckmin – a vitória democrática, nacional e progressista, que apeou do Planalto a extrema-direita e alterou a correlação de forças na disputa política brasileira –, eis que a reação bolsonariana optou pelo seu “Capitólio” caboclo. Com a reversão das expectativas, passou a protestar contra o resultado nas urnas e pedir a liquidação do regime democrático, mediante o autogolpe. Sem forças próprias para desfechá-lo, sobrou-lhe a condição passiva de provocadora-pedinte nos quartéis, querendo comprometer os militares na ilegalidade aventureira de obstruir a posse dos escolhidos.

Ao mesmo tempo em que violaram os espaços indispensáveis à segurança das tropas e as colocaram na situação constrangedora de aliciamento anticonstitucional, os falangistas procuraram obstruir as estradas e consumar uma crise duradoura. Isolada socialmente, criticada por quase todos e sem o apoio massivo dos caminhoneiros – cujas entidades sindicais desautorizaram o putschismo, criticando seus agrupamentos armados e financiados externamente –, a tentativa de bloqueio em pouco tempo se reduziu a resquícios. Para tanto contribuiu a realidade, que o comando ignorou solenemente.

Assim, os conspiradores, que representam o segmento mais conservador e reacionário dos magnatas monopolista-financeiros, estorvaram o metabolismo do próprio capital, prejudicando a circulação de bens. Setores do empresariado – inclusive pela voz das suas representações, frisada por comentaristas na mídia privada – relataram e reclamaram sobre os transtornos causados aos traslados mercantis, País afora: desabastecimentos; rebaixamento nos estoques de medicamentos e alimentos; carência de pescado e demais carnes; atrasos e cancelamentos nas entregas; paralisia nos restaurantes.

Se a situação continuasse, afetaria o fornecimento regular de matérias primas para os ramos industriais, o fluxo normal de cargas para o consumo e a realização de mais valia. Sintomático foi o pronunciamento feito pela senhora Tereza Cristina – referência do latifúndio capitalizado, ex-ministra no Governo em ocaso e senadora eleita por Mato Grosso do Sul –, que se apressou em declarar que o lockout “prejudica a economia do Brasil e, principalmente, nosso agro”. Acontece que os desesperados bolsonaristas, com sua ignorância, autossuficiência e prepotência, estorvaram o calendário da grande agropecuária.

Em 9/4/2022, o site Rural Pecuária – Produtores devem ficar atentos aos prazos de plantio e colheita das culturas – informava que, resguardando-se as especificidades regionais, os plantios de soja, milho, algodão e arroz têm seu auge no mês de novembro, quando adubos e sementes precisam passar pelas rodovias, sem falar da colheita nos trigais, com a consequente comercialização. Como se não bastasse, o estorvo atingiu também o trânsito bovino aos frigoríficos, vez que a liberação de animais confinados estava fluindo, sem falar na entrega de suínos e frangos acabados, muito menos sensível aos aspectos sazonais.

O ar de ruína, mostrado pelo movimento social-temático que deseja revogar o pronunciamento popular, deve-se não só à estreiteza de seu mote confesso, como também ao isolamento em face dos interesses dominantes, inclusive a maioria pragmática de seus políticos, entre os quais vários apoiadores da candidatura derrotada. Nesse quadro, a coerção estatal, inicialmente ambígua, foi tangida pela firme ação da Justiça, que à defesa das liberdades fundamentais agregou de bom grado a ”ordem” burguesa inscrita, pela ironia hegeliana da história, na bandeira que demagogicamente os anticomunistas brandem.

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