Por Isem—
O Instituto Sergio Miranda (Isem), a Paco Editoral e a Livraria Jenipapo convidam para o lançamento do livro Dialética e valor em Marx e nos clássicos do Marxismo de Zaira Vieira Rodrigues no próximo dia 29/3, às 10h, na Rua Fernandes Tourinho, 241, loja 4.
O livro tem apresentação do Professor associado da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) Jadir Antunes e Prefácio de Roberto Finelli, Professor da Università Roma Tre.
“A obra Dialética e valor em Marx e nos clássicos do marxismo, de Zaira Vieira, se inscreve, por esses motivos, como uma obra de leitura e estudo obrigatórios para o resgate da vivacidade crítica, dialética e revolucionária do pensamento, da obra e do método de Marx,…” (Apresentação)
Zaira Rodrigues Vieira: É doutora em Filosofia pela Université Paris Nanterre. Possui Pós-doutorado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (2015). Mestre em Filosofia e graduada pela Universidade Federal de Minas Gerais. É professora Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais/ Campus BH.
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Apresentação:
A obra Dialética e valor em Marx e nos clássicos do marxismo, de Zaira Vieira, que ora tenho a honra de apresentar, resultado de sua tese doutoral em Filosofia defendida na Université Paris Nanterre e agora traduzida para o português, é uma monumental discussão sobre, talvez, a mais importante questão do pensamento e da obra de Marx: a questão do método de exposição.
A obra de Zaira Vieira não se interessa apenas em expor, debater e criticar as principais concepções sobre a questão do método, mas, sobretudo, afirmar sua própria concepção original acerca da questão. Sua tese central, apoiada numa rica, extensa e complexa bibliografia, apoia-se no primado, correto, de que a teoria do valor em O Capital pressupõe uma série de conceitos e problemas que só serão expostos e desenvolvidos por Marx ao longo da exposição do conjunto de suas posições críticas acerca do capital e de seu processo de valorização.
Tais pressupostos, ainda ocultos na breve apresentação do problema do valor exposto na primeira seção de O Capital, vão sendo expostos e, assim, determinando e enriquecendo aquilo que no começo aparece com uma grande e árdua abstração, como é a natureza do começo de O Capital, somente ao longo de toda a obra madura de Marx.
O problema do valor enquanto conceito genérico e abstrato, enquanto substância social comum ao mundo da mercadoria, enquanto substância que domina o mundo aparente da igualdade e da reciprocidade da circulação simples da mercadoria, se torna ou aparece, lentamente, pela lógica imanente do próprio objeto investigado por Marx, como troca capitalista entre capital e força de trabalho e, portanto, troca desigual, troca de não equivalentes, na medida em que o trabalhador entrega mais valor e mais trabalho do que recebe do capitalista.
Esta mesma troca, agora de não equivalentes, segundo a lógica do próprio objeto investigado e exposto pela letra de Marx, logo se Zaira Rodrigues Vieira dissipa e se converte em mera circulação sem troca, em mera mudança de mãos da riqueza sem troca, sem reciprocidade e sem equivalência, quando a mais-valia é acumulada e convertida em capital e o capitalista passa a comprar trabalho com o próprio trabalho do trabalhador, como aparece na seção sobre a reprodução do capital.
Se no começo da exposição de O Capital, neste começo abstrato no qual o valor aparece como mera gelatina de trabalho enquanto tal, em que os agentes da troca aparecem nas figuras abstratas de comprador e vendedor de coisas externas e alienáveis, em que ainda não aparece o trabalhador como vendedor de uma mercadoria que não se diferencia nem se separa do corpo e da alma do vendedor, em que as classes e a diferença essencial entre os verdadeiros agentes do processo de troca estão abstraídas, logo a partir do capítulo quarto, porém, já se desmorona este mundo de abstrações, de liberdade, igualdade, reciprocidade e equivalência, mundo do qual a ideologia liberal se alimenta, para surgir o trabalhador vendendo-se ele próprio como mercadoria em troca de dinheiro.
Logo em seguida, já no capítulo quinto e no interior da fábrica, surge o processo de produção como processo de consumo da mercadoria comprada, como consumo do corpo, de um corpo humano vivo, como consumo das energias físicas e intelectuais do próprio vendedor, da mercadoria força de trabalho, a mercadoria que fundamenta a existência de todas as demais mercadorias e todo o processo de troca simples que aparecia inicialmente na exposição. Segundo a tese, correta, de Zaira Vieira, a circulação simples da mercadoria, as coisas sendo produzidas e trocadas como mercadorias, o tempo igual de trabalho enquanto medida do valor, o fetiche, a reificação e o domínio do dinheiro sobre a vida humana não são, de fato, compreensíveis em si e por si mesmos, pois sua compreensão correta requer o avanço da leitura e da exposição para além dos domínios da troca simples apresentada na primeira seção de O Capital.
A compreensão correta deste começo requer o avanço da exposição segundo as exigências do próprio objeto investigado, pois se requer a exposição dos pressupostos ainda não expostos do ser Dialética e valor em Marx e nos clássicos do marxismo capital: a existência do trabalhador enquanto vendedor de força de trabalho, do vendedor separado da propriedade dos meios de produção e de subsistência, do vendedor que, separado destes meios, possui apenas a potência para o trabalho mas não os meios e os materiais necessários para a conversão desta potência em realidade, pois estes meios e materiais são agora propriedades de um ser estranho ao mundo do trabalho, de um ser que só vê no trabalho a fonte de valorização de seu capital.
É assim, concebendo a necessidade de uma leitura completa e total de O Capital que Zaira Vieira analisa e critica a vasta literatura marxista sobre o problema do valor e do método de exposição empregado por Marx em O Capital. O primeiro da fila a ser criticado por Zaira Vieira é Engels, o primeiro e mais influente de todos os intérpretes de Marx e de O Capital que atribui ao começo de O Capital um caráter empírico e factual, considerando o começo como um suposto modo de produção simples de mercadorias em que a lei do valor teria vigorado, diretamente, um modo de produção que teria antecedido historicamente o capitalismo. O segundo deles é Lênin que, desconhecendo os Grundrisse, nos quais os problemas relacionados ao método de Marx estavam mais bem expostos, recomenda a leitura da Ciência da Lógica de Hegel como meio de se superar as lacunas metodológicas de Marx.
Após estes, e sustentando-se sobre uma profícua análise de Marx, com base especialmente nas leituras de Roman Rosdolsky e Georg Lukács, seguem-se as obras de uma lista de intérpretes consagrados como Martin Nicolaus, Moishe Postone, Hans-Georg Backhaus, Della Volpe, Norberto Bobbio e Louis Althusser que são pacientemente analisadas e criticadas por Zaira Vieira. Incansavelmente, a autora se esforça em mostrar o caráter abstrato do começo, e que essa abstração se deve exatamente ao fato de se tratar do começo de um processo de exposição dialético que se eleva das mais imediatas, simples e formais determinações do objeto investigado às mais profundas e ocultas determinações reais, tais como as determinações que começam a surgir já a partir da segunda seção, na qual surge a compra e venda da força de trabalho, até as determinações últimas que se produzem a partir desta segunda seção, tais como as que surgem a partir da produção da mais-valia, da acumulação e reprodução do capital, da acumulação primitiva de capital e, enfim, das classes, da luta de classes, da negação da negação, da expropriação dos expropriadores, da crise do capital e da falência total do processo de valorização do valor em seu conjunto que surgem ao final da exposição na letra do capítulo XXIV – A assim chamada acumulação primitiva.
Querendo encontrar todas as determinações concretas e fundamentais logo no começo da exposição, negando-se a percorrer e analisar pacientemente, dialeticamente, o conjunto da exposição de O Capital, recusando-se a conectar intimamente os conceitos mais abstratos aos mais complexos e concretos e a compreender os mais complexos e concretos como pressupostos e fundamentos dos mais abstratos e primeiros, os intérpretes apontados e criticados por Zaira Vieira, com a exceção de Lênin e em certo sentido também de Engels, tombaram, assim, inférteis e sem vida nos braços do positivismo, do estruturalismo e do cientificismo acadêmico. Seu legado, por isso, não produziu nenhum movimento, não inspirou nenhuma geração de ativistas revolucionários e nunca ultrapassou os muros das revistas e dos institutos de pesquisa das universidades europeias.
A obra Dialética e valor em Marx e nos clássicos do marxismo, de Zaira Vieira, se inscreve, por esses motivos, como uma obra de leitura e estudo obrigatórios para o resgate da vivacidade crítica, dialética e revolucionária do pensamento, da obra e do método de Marx, um método que pretende explicar não somente o sentido, a natureza e a lógica das categorias econômicas fundamentais da sociedade capitalista, mas, explicar cientificamente, sobretudo, a natureza do modo de vida dominado pelo capital e como este mesmo modo de vida cria, contraditoriamente, os meios materiais e espirituais necessários para a sua própria superação revolucionária.
Jadir Antunes
Professor associado da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste)