Por Maria Luiza Franco Busse*—

“Você está demitido”. Com essa frase Donald Trump apresentou e coproduziu durante 10 anos The Apprentice, O Aprendiz. O reality show estreou em 2004 e foi levado ao ar pela NBC, National Broadcasting Company, canal de televisão estadunidense de propriedade da Universal Filmes e Entretenimento. A música de abertura era For the love of Money, Por amor ao dinheiro. O programa foi franqueado no Brasil e manteve  o nome em tradução literal.

Trump deixou os estúdios em 2014, mergulhou na carreira política institucional, se elegeu presidente do Estados Unidos e tomou posse em 2017 sem nunca ter deixado os negócios empresariais que lhe deram fortuna e fama. O duplo holofote parece ter produzido no empreendedor a dissociação com o real, o que costuma causar efeito trágico no mundo da vida.

O efeito sugere se confirmar no encontro entre Trump e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, no Salão Oval da Casa Branca na última sexta-feira, 28, que fechou o mês de fevereiro. Pela primeira vez, o mítico espaço que ostenta o quadro com a figura solene de Abraham Lincoln deu a impressão de ter sido transformado em estúdio de televisão, pronto para a transmissão ao vivo da emulação de O Aprendiz. A diferença em relação aos participantes originais, que conheciam o roteiro, é que o convidado da vez parecia ter sido pego de surpresa. O que não deixa de surpreender. Zelensky se forjou no universo do entretenimento. Era um homem midiático antes de ser eleito presidente com campanha contra a corrupção. Comediante, produtor de filmes e de programas de televisão, onde ficou famoso no período de 2015 a 2018 com a série Servo do povo em que protagonizava o papel de presidente da Ucrânia. Em 2019, saltou direto da tela para a realidade de sentar na cadeira presidencial e governar o país.

Zelensky não ouviu Ska, composição do Paralamas do Sucesso que diz assim: “A vida não é filme, você não entendeu, de todos os seus sonhos não restou nenhum, ninguém foi ao seu quarto quando escureceu, e só você não viu, não era filme algum”. Parêntese: o nome Ska não tem nada a ver com a letra, mas com a batida melódica. Foi uma homenagem da banda ao ritmo jamaicano que mistura levadas caribenhas, jazzísticas e do Rhythm and Blues.

Pois é, Zelensky também não ouviu a Rússia. Preferiu escutar o som de uma Europa ultrapassada, escudada numa OTAN dependente do armamento do Estados Unidos sempre interessado, tão somente, em si mesmo. Trump foi claro ao ouvir críticas de Zelensky sobre seu alinhamento com Putin. De dedo em riste, disse que seu alinhamento é com o Estados Unidos e que Zelensky tem que aceitar o fim do conflito sob pena de ser o responsável pela Terceira Guerra Mundial. 

Que tristeza. Guerra já é uma tristeza, ainda mais com a probabilidade de ser justificada pela atuação de uma nulidade manipulada que posou de estadista para a capa da revista Vogue publicada em outubro de 2022. Em pleno combate. Ele e a mulher. Olena Zelenska e Volodymyr Zelensky, uma tragédia. 

 

*Jornalista há 47 anos e Semiologa. Professora Universitária aposentada. Graduada em História, Mestre e Doutora em Semiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, com dissertação sobre texto jornalístico e tese sobre a China. Pós-doutora em Comunicação e Cultura, também pela UFRJ,com trabalho sobre comunicação e política na China. Artigo publicado originalmente em Brasil 247.


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