Há dois anos, em Davos, quando se iniciava 2020, Paulo Guedes anunciava triunfante a propalada “recuperação” da economia brasileira. Colhia, então, aplausos dos mais desavisados e dos magnatas otimistas com a “salvação” de suas ansiadas oportunidades. As profecias ministeriais encontravam sustentação nas declarações do FMI, otimista com a contrarreforma da Previdência, no chamado “ânimo” do mercado, entusiasmado com as promessas de privatização, e nos prognósticos das fontes oficiais, convencidas sem dúvida nenhuma de que o PIB cresceria em 2,5 a 3% nos 12 meses posteriores. Todavia, em um dos mais vexatórios desmentidos registrados pela vida na história pátria, a soma dos bens ou serviços criados naquele período mergulhou verticalmente no abismo de –4,1%.
Claro está que os +4,6% obtidos em 2021 eram “poule de dez”, como normalmente os turfistas se referem aos palpites com risco mínimo. Afinal, tinham como termos comparativos não só a resiliência da concavidade na crise conjuntural, como também a recessão anterior. No entanto, a modorra – os índices medíocres de crescimento – retornou em 2022 com a recuperação de 1,5% no primeiro trimestre se comparado ao anterior, conforme a FGV, que recuperou só a devastação acumulada. Na verdade, a paralisia demonstra que até hoje permanece inútil o esforço de superar o baque cíclico do capitalismo interno iniciado em 2014 e pronunciado em 2015-2016, bem como adubado pela pandemia e, principalmente, pelas políticas ultraliberais que só fizeram onerar os trabalhadores.
Tal situação – refletindo no terreno local os efeitos relacionados à Fase Depressiva ou B da presente Onda Longa mundial, no padrão Kondratieff – mostra-se mais agravada pela estagnação em âmbito planetário. As recaídas recessivas e inflacionárias se multiplicam, particularmente nos USA e na UE, sendo intensificadas pela guerra terceirizada que a Otan promove na Ucrânia. O momento é tão adverso que os prognósticos mais otimistas, publicados aqui pelas instituições públicas e do capital financeiro, atrevem-se a estimar um PIB de até 1,5% para este ano, amparadas somente na esperança de uma carestia nas commodities. Mesmo assim, todos – exceto a suspeita omissão dos governistas – projetam uma redução para 2023. Sobre a inflação desenfreada, os fatos são eloquentes.
O quadro acima emoldou agora, nos Alpes suíços, a performance do enviado bolsonarista. Conforme suas palavras, o Brasil teria voltado a crescer, a mesa estaria posta para os negócios e haveria uma completa garantia para os conglomerados bilionários. Ao contrário da primeira proclamação, as duas últimas são críveis: correspondem à sua ideologia e vontade política, pelo menos até o fim de ano. Inobstante, a sua recepção pelos “investidores” foi arruinada pelo pragmatismo eleitoreiro do chefe sobre a Petrobras. Na véspera, jogara no colo dos nomeados e governadores a responsabilidade pela elevação nos combustíveis. Quem desconhece o segredinho de Polichinelo? Alguém ignora que o comando palaciano vincula sua política de preços ao mercado internacional monopólico?
Mas o fiasco não ficou só na retórica de ambiguidades, pois surgira um turbilhão de péssimos números na economia brasileira. O IPCA-15 chegou a 0,59% em maio: embora ostentasse uma desaceleração perante abril, foi o maior para o mês nos sete últimos anos. A queda ficou bem menor do que a expectativa, denunciando a depreciação monetária crônica e alargada. Eis porque a pose ufanista rapidamente se transformou em ataques aos rivais no sufrágio que se aproxima e defesa dos “feitos” falangistas, em atestado inequívoco de provincianismo. Sem conseguir firmar qualquer acordo concreto, sobrou-lhe a diplomacia de um embaixador improvisado e rombudo, ao estilo miliciano, cutucando nominalmente os “culpados” pela resistência da OCDE ao ingresso do País no seu bloco.
Perdendo completamente os argumentos, a compostura e o eixo, sobrou-lhe a futurologia. O representante oficial do Planalto jurou que a Nação “vai se livrar da inflação antes das economias mais avançadas”, um diagnóstico inexplicável, já que a majoração dos preços no G20 – em média, 7,9% – é bem menor do que os 11,3% daqui. Ademais, acrescentou por conta própria mais 0,5% à estimativa do PIB que os subordinados informaram e jurou de cara dura que a precificação em alta está controlada. Por fim, como Pilatus, lavou as mãos sobre o custo estratosférico dos combustíveis: “O presidente indica o ministro; o ministro indica o Conselho; o Conselho indica o CEO e a Diretoria. É isso.” Esqueceu-se de informar um “detalhe” relevante no ano eleitoral: o povo indica o presidente.